Apelidada de "mensalão", a Ação 470 do Supremo
Tribunal Federal (STF) encontra-se na fase de julgamento do item núcleo
político em que o relator, ministro Joaquim Barbosa, tenta incriminar deputados
e ex-deputados federais, uns ainda vivos e outros já falecidos, por
supostamente haverem recebido recursos financeiros para votar com o governo
federal nas matérias reforma da previdência e reforma tributária.
A imprensa divulgou que, segunda-feira (17), o mencionado ministro lembrou com sorriso irônico um comentário de um deputado de que as diferenças entre o PT e o PP eram muito grandes para haver um acordo com bases políticas e insinuou que só a compra de votos justificaria o apoio do PP ao governo. Complementou afirmando que no Brasil as diferenças entre os partidos são irrelevantes e que todos são iguais. O ministro Marco Aurélio Melo manifestou-se de forma similar.
Ficamos indignados com esse discurso que busca colocar na
vala comum uma agremiação que nasceu na luta pela redemocratização do Brasil,
cresceu e se consolidou atuando nos parlamentos e governando municípios,
estados e a república com resultados de melhoria das condições de vida e
trabalho do povo brasileiro reconhecidos internacionalmente. Entre acertos e
erros, consideramos que possuir mais de um milhão de filiados e ser o partido
de maior preferência da população brasileira, disparado em relação aos outros
partidos, é o maior reconhecimento do balanço positivo da atuação do PT em seus
32 anos de existência.
Ser expectador da manifestação irônica e descabida de um
ministro do STF quanto a um partido possuidor de tal patrimônio, conquistado na
luta cotidiana do povo trabalhador, revolta direção, filiados, militância e
simpatizantes petistas. Esse é o sentimento que nos domina.
No Brasil há 30 partidos constituídos em um sistema
eleitoral e partidário fragmentado, voltados para atender os interesses mais
diversos da representação política da sociedade brasileira. Assim sendo, não
pode causar estranheza ou espanto que acordos eleitorais e apoios a governos
sejam realizados com diferentes composições que, na maioria das vezes,
incorpora contradições aparentemente insanáveis. É bom lembrar que as alianças
de primeiro e segundo turnos da eleição de FHC e depois a composição da base
aliada de seu governo foram realizadas com essas contradições e rechaçadas por
setores compostos por intelectuais tucanos.
Esse sistema fragmentado substituiu o anterior, imposto pelo
golpe de 1964, que se resumia a um simulacro de sistema bipartidário no qual a
Aliança Renovadora Nacional (ARENA) apoiava o regime militar incondicionalmente
e, do outro lado o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) reunia as forças que
lutavam pela redemocratização do país acossado pelas botinas e tanques
militares, pelo desaparecimento sumário de pessoas e cassação de parlamentares
de oposição. As arbitrariedades da ditadura também atingiram o STF com a força
do Ato Institucional Nº 5.
Em relação ao julgamento da Ação 470, nossa expectativa é que
as provas testemunhais e técnicas sejam apresentadas de forma concreta pelo
relator. Desejamos saber quem foram, nominalmente e seus respectivos partidos,
os parlamentares que faziam parte da base aliada e quanto receberam em dinheiro
cada um para aprovar projetos do governo, pois essa foi a denúncia feita, há
sete anos, e que agora precisa das provas. As provas são os elementos que
garantem a veracidade dos fatos denunciados.
Condenar sem elas atinge de morte o estado de direito
democrático reconquistado com a promulgação da Constituição de 1988, há 24
anos. Na história da república brasileira, bom ainda lembrar, esse é o maior
período de experiência democrática sobre a qual, nesse momento, paira indícios
de ameaça produzidos por determinadas teses defendidas no julgamento do
mensalão. Uma dessas teses é a do “domínio do fato” que o Procurador Geral da
República e o relator do STF interpretam de forma equivocada, segundo nosso
juízo, pois elimina a presunção da inocência e tende condenar o réu por ouvir
dizer que ele cometeu esse ou aquele delito.
As gerações atuais e próximas que consideram a democracia um
valor universal não podem e não devem permitir que essa experiência retroceda,
pelo contrário devem continuar na luta para que a democracia se aprofunde e
avance. Esse é mais um desafio a vencer pelo PT e todos os setores democráticos
da sociedade brasileira.
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